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A muleta do “racismo”

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A muleta do “racismo”
Chamou-me o Rafael Pinto Borges a atenção para um texto sobre o urbanismo de Nova Lisboa/Huambo inserto no Heritage of Portuguese Influence/ Património de Influência Portuguesa — HPIP, sítio-web gerido pela Fundação Gulbenkian. Nele se diz que «a concepção da cidade do Huambo traduzia a visão imperial e a modernidade do novo século. Confessadamente inspirada em cidades das Américas e de colónias britânicas, refletia o conceito da garden city (cidade com cintura verde e áreas planificadas para residência, serviços, indústria e agricultura) acrescido dos “bairros indígenas”, numa época em que todas as potências coloniais promoviam a segregação racial nos lugares de residência e sociabilidade.»
Mau grado as evidências, parece predominar entre os nossos uma fixação obsessiva em tresler a história portuguesa africana, viciando-a num inexistente paradigma racista e segregacionista que, de facto e de jure nunca existiu, facilitando, assim, por preguiça, por ignorância, por oportunismo ou simples mimetismo, a circulação extra-muros de “estudos coloniais” palatáveis para americanos.
Na concepção de cidade ultramarina, sobretudo naquelas em que foi possível total liberdade de criação, posto ali nada pré-existir que entravasse o planeamento urbanístico, houve uma clara preocupação em assinalar e demarcar as funcionalidades: centro administrativo, zona comercial, zona residencial urbana, zona fabril e zonas periurbanas residenciais na proximidade de explorações agrícolas. O texto da HPIP, desconhecendo a sociologia africana portuguesa, insinua que os negros eram colocados à margem da “cidade branca”. De facto, o que houve foi uma preocupação em garantir aos negros trabalho e viabilizar as suas explorações agrícolas, inserindo-as nas necessidades da cidade; logo, garantindo-lhes mercado de proximidade e maior facilidade de escoamento e venda das suas produções. Porém, em Nova Lisboa/Huambo, como em todas as cidades e vilas criadas pelos portugueses no Planalto Central, os negros não eram os únicos agricultores. De Portugal chegaram levas de colonos agricultores que foram assentar vida na periferia dos povoados, em condições exactamente análogas às dos seus vizinhos negros.
Mutatis mutandis, tal aconteceu em todas as regiões do Portugal europeu. Os camponeses de Trás-os-Montes, das Beiras e do Alentejo que demandaram as cidades da orla costeira, sobretudo Lisboa, Aveiro e Porto, não se estabeleceram no centro, mas nas periferias. Em Nova Lisboa/Huambo não houve, pois, “privilégio branco”, nem segregação, mas promoção da actividade agrícola, valorizando-a e introduzindo-a no mercado.
Há cerca de um ano, o insuspeito Jean-Luc Mélenchon, líder da esquerda francesa, também ele natural da Argélia e pied-noir, afirmou que «a noção de ‘privilégio branco’ só pode ser usada por quem nunca viu um branco pobre», ou seja, por quem tem uma ideia absolutamente falsa sobre o trem de vida da maioria dos colonos brancos na Argélia Francesa. Quem diz Argélia, pode dizer brancos portugueses esforçados, humildes e pobres que juntamente com os seus vizinhos negros desbravaram matas, domaram a terra inculta e delas fizeram plantações que alimentaram, deram trabalho e fizeram de Angola um dos maiores produtores de alimentos na África das décadas de 50, 60 e 70.
MCB
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